Post de helenafmatos
Mas onde os demais vêem boas notícias – logo ausência de problemas – os investidores no sector do combate ao grande problema vêem um risco: a sua inutilidade torna-se óbvia. E por isso passam de imediato ao ataque criando o grande problema. No caso da Autoeuropa o grande problema é o trabalho ao sábado: para responder ao acréscimo de produção, a administração da empresa propôs que a unidade passasse a funcionar de segunda a sábado, com os trabalhadores a terem uma folga fixa, ao domingo, e duas folgas consecutivas a cada três semanas. O acordo celebrado com a Comissão de Trabalhadores previa ainda um pagamento mensal de 175 euros adicional ao previsto na lei, 25% de subsídio de turno e um dia adicional de férias.
Mas tudo isto, segundo os investidores no grande problema, é um atentado aos trabalhadores e muito particularmente às suas famílias pois, argumentam, de modo algum estas podem ver um dos seus trabalhar ao sábado. Como se sabe as famílias dos trabalhadores da Autoeuropa não fazem compras ao sábado, não vão ao café nem aos restaurantes ao sábado, não vão à praia ao sábado para poupar os nadadores-salvadores da ignomínia do trabalho nesse dia… Nada de nada: ao sábado ficam em casa adorando-se uns aos outros. Nem a televisão ligam. E portanto a greve foi decidida na Autoeuropa para 30 de Agosto.
Pelo caminho a Comissão de Trabalhadores demitiu-se e os sindicatos, grandes investidores no sector do combate ao grande problema, estão a tentar controlar a Autoeuropa. Se levarem a melhor não é difícil antecipar os novos combates aos novos problemas: lá virá a manifestação contra a deslocalização da produção da Autoeuropa para um outro país. A que se seguirá a manifestação em Bruxelas – em que se integrarão alguns eurodeputados daqueles grupos parlamentares que são contra a existência de eurodeputados – para dar conta já não de um mas sim de dois enormes problemas: o enorme problema gerado pelo facto de a Autoeuropa estar a deslocalizar a produção de Portugal para outro país e o enorme problema que esse acréscimo de produção irá levar ao país para onde for transferido. Claro que há sempre a possibilidade de a produção ser deslocalizada para a Alemanha o que permitirá uma manifestação contra a senhora Merkel que é uma performance que fica sempre bem.
A isto juntar-se-á a delegação que vai ao parlamento português protestar contra as empresas que vêm para Portugal e depois desistem do país, os pedidos da esquerda patriótica para que o Governo que intervenha na Autoeuropa e o apelo de todos os grupos parlamentares para que se crie uma linha de apoio aos pequenos proprietários da região afectados pela diminuição de actividade na Autoeuropa. Um observatório dirigido por um clone do professor Boaventura observará os impactos da situação na Autoeuropa e um cineasta daqueles que são contra o capitalismo e andam de passadeira vermelha em passadeira vermelha pelas mecas do capital fará um filme alternativo sobre os homens sem esperança da Autoeuropa… Tudo sempre em nome do combate ao grande problema que pouco a pouco já nem se sabe qual era pois tantos e tais foram os outros problemas que houve que combater.
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