Está a ser um sucesso a greve de 24 horas que hoje se cumpre na fábrica da
VW em Palmela. Está a ser. O problema é… se vai ser um sucesso. Há dois dias,
Nicolau Santos perguntava aqui se os trabalhadores tinham bem consciência do
que estão a fazer. Eu, não sendo trabalhador daquela fábrica, posso adiantar
duas respostas: ou não sabem e estão a ser manipulados (que deve ser a mais
próxima da verdade); ou sabem e estão a proceder de uma forma inacreditável.
Afinal, a grande guerra, que por algumas contas só hoje custa milhões de
euros e que pode atirar pelo menos parte da produção de um novo modelo para
outro país, dá-se em torno de trabalhar ou não ao sábado. Mas não é trabalhar
de graça. É com compensação de outra folga e com mais 175 euros mensais
(bastante abaixo dos 400 se os vencessem em horas extraordinárias). Além disso,
e esta parte não pode ser descurável para os decisores, haveria emprego para
quase mais dois mil trabalhadores.
Penso que para se ter total consciência do que se está a fazer na
AutoEuropa (e são sindicatos afetos à CGTP que lideram o processo), nada melhor
do que ver o que afirma o histórico coordenador da Comissão de Trabalhadores da
fábrica (1996-2016), António Chora, um homem afeto ao Bloco de Esquerda. Diz
ele, hoje mesmo, ao ‘Jornal de Negócios’, meses depois de se ter reformado, em
janeiro deste ano: “Orgulho-me de ter sido membro de uma CT que começou numa
fábrica com 144 pessoas. Saí de lá com quatro mil, contrariamente a muitos
sindicatos que entraram lá com 11 mil e saíram com ninguém, como na Lisnave,
CUF ou Quimigal. Tenho muito orgulho no meu trabalho”.
O caso não é para menos. Com António Chora à frente da CT chegou-se sempre
a acordo antes de haver qualquer greve (as únicas greves na AutoEuropa foram as
greves gerais nacionais). Fernando Sequeira, que lhe sucedeu na CT (e cujo
acordo com a administração foi chumbado em referendo pelos trabalhadores),
acusa o SITE (Sindicato das Indústrias Transformadoras, afeto à CGTP) de ter
‘inflamado’ a empresa, ou seja extremado posições que não conduzem a um acordo
profícuo.
Uma coisa é decidir no imediato, outra é resolver com os olhos no futuro
Muita gente lembra o paralelo entre a Opel na Azambuja e a VW em Palmela.
Em 2005 ambos os fabricantes tiveram dificuldades e anunciaram que iriam fechar
fábricas. A Opel, dirigida pelos sindicatos da CGTP fechou mesmo. Chora, com o
seu talento negocial, conseguiu que a VW vendesse a sua fábrica de Bruxelas e
mantivesse a de Portugal. Que aí continua, 12 anos depois, com mais
trabalhadores, com a melhor produtividade do grupo e com a incumbência de fazer
um novo modelo – 240 mil automóveis no próximo ano -, para o qual necessita que
os trabalhadores compareçam seis dias por semana. Alberto Vale, do SINDEL,
sindicato afeto à UGT, sublinha que há sectores da indústria que têm laborações
contínuas de 24 horas e sete dias por semana, pelo que não entende a
inflexibilidade demonstrada.
Podemos envolver política nisto. Talvez a CGTP estivesse farta de ter a
principal fábrica do país fora do seu controlo. Talvez queira mostrar ao
Governo a força que tem. Talvez muita coisa.
Mas há algo que todos percebemos: uma coisa é decidir com base no imediato
– se os trabalhadores poderiam receber mais 400 euros mensais, por que razão se
contentam com mais 175? - outra é resolver com os olhos no futuro: e se depois
desta gloriosa e vencedora greve, a AutoEuropa, por decisões que nos escapam
(estão na Alemanha) começa a definhar e tem o destino dos exemplos dados por
António Chora ou da Opel?
E esta questão não é um problema apenas da CGTP ou do PCP. É, em geral,
deste Governo, de todos os governos. Foi assim, olhando apenas o imediato, que
chegámos a muitos lados onde não deveríamos estar. Na gestão do interior, na
questão dos fogos, nas relações com outros países (veja-se o que ainda hoje se
passou com a Venezuela). António Chora chama-lhe ‘populismo’. E é isso mesmo,
puro populismo. Nem mais!
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