O BES mau anda em parte incerta no inferno dos devedores. O governador do Banco de Portugal deixou de falar e produzir declarações fatais e muito definitivas ao domingo pela calada da noite. A CMVM anda a cozer processos por suspeita de abuso de informação privilegiada e a ver o que pode e não pode fazer. Ouvir os ministros, investigar se algum tinha ações do BES ou se algum primo afastado, um parente, soube o que não deveria saber?
Malditas regras e leis, nunca deixam fazer nada em tempo útil emPortugal, exceto permitir que a ASAE prenda chouriças e lacostes de imitação para interrogatório imediato na esquadra lá do bairro. Dá sempre umas belas reportagens. Os mercados - não o de capitais, os outros - são pitorescos, os detidos têm aquele ar suspeito, algum crime terão cometido. No processo BES não é assim, não acontece nada. Para os reguladores, os primeiros chamados a agir nestas circunstâncias, está tudo esplêndido, quase esplêndido, é agosto, as pessoas vão de férias, não é?
Vejamos. Uma semana vertiginosa, a derrocada do BES, alguns dias com notícias muito claras e muito certas - ou que pareciam muito claras e muito certas: vai ser pago isto, vai ser separado aquilo, está tudo bem, nasceu um novo banco, assim é que é, business as usual. Será? Quer dizer, duas semanas após o naufrágio pilotado pelo Banco de Portugal, ungido pelos poderes galácticos atribuídos de supetão pelo Governo, a urgência deu lugar à complacência que já não consegue esconder os perigos disfarçados de perplexidades.
Quase tudo o que o Banco de Portugal disse que ia acontecer na verdade não se concretizou exatamente assim. A separação do lixo tóxico dos ativos saudáveis - uma separação que seria quase instantânea a levar à letra as palavras ingénuas do governador -, afinal é mais demorada e sensível. Há clientes que se perguntam: estou no banco bom ou no banco mau? Uns desejam por tudo estar no mau. Quem comprou dívida da Rioforte e da Espírito Santo Internacional soube (finalmente) esta semana que irá receber o dinheiro, mas falta saber como, quando e em que termos.
Não faltam dúvidas. Ao atirar para o Banco de Portugal a liderança do processo, o Governo protegeu-se, limitou os estragos nas finanças públicas - facto muito relevante - mas perdeu o controlo das operações e agora assiste à confusão, para usar uma palavra simpática, a partir da varanda. Um banco sistémico vai ao fundo, os reguladores perdem tempo, demoram a agir antes, durante e depois, e o governo acha normal? É normal não sabermos ainda o que acontecerá ao Novo Banco? É vendido, retalhado, leiloado às peças? O governador não sabe, não responde. Esquece-se que, apesar de novo, o velho risco sistémico não desapareceu. A dona Inércia voltou, mas sem o Ronaldo.
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