Na avalanche de notícias sobre a Quinta da Fonte, houve uma que apareceu pequenina nos jornais e tem sido pouco valorizada, mas é muito reveladora e instrutiva. Veio do vereador da Câmara de Loures com o pelouro da habitação e diz que a renda média das habitações do bairro é de 4,26 euros por mês. Mesmo assim, as rendas em atraso já atingem um milhão de euros. Esta verba corresponde a 50 mil mensalidades em dívida. Sendo 776 os fogos existentes, temos cinco anos de rendas por pagar num bairro habitado há pouco mais de dez.
O comum dos cidadãos não compreende que uma família não pague os quatro euros de renda, disse o vereador ao 'Público'. Pois não. Por motivos vários - e nem é preciso ir buscar as imagens daquele chefe de família que, vindo da 'manif' defronte da sede do município de Loures, se deslocou ao bairro para mostrar às televisões onde estavam os objectos que lhe terão roubado: o plasma, o DVD, a TV e a "playstation" do miúdo, a máquina da loiça...
O comum dos cidadãos sabe, em primeiro lugar, que, se não pagar a sua renda ou a prestação da casa, recebe ordem de despejo e põem-lhe os móveis à porta. E se lhe ocorrer ir acampar com a família em frente da Câmara Municipal, é provável que a polícia corra com ele na hora e não daí a três dias. Depois, o comum dos cidadãos pode não ter dinheiro para mais nada, mas a renda é a última dívida que deixa de pagar, como os bancos sabem melhor do que ninguém. As duas atitudes - a noção de que a falta tem castigo e de que um compromisso, mesmo o de uma renda simbólica, é para ser cumprido - revelam um certo tipo de relação do tal cidadão comum, seja um pobre de sempre, seja um 'novo pobre', com a casa que habita e com a própria sociedade.
O que mostram as contas das rendas na Quinta da Fonte é a atitude oposta: a ausência de toda a responsabilidade, a arreigada noção de que os pobres, por serem pobres - e mais ainda se forem negros ou ciganos - só têm direitos e nenhum dever, o desprezo por qualquer compromisso e a certeza absoluta da impunidade total em caso de incumprimento, mesmo reiterado.
Esta é a filosofia de vida que o Estado assistencial tem promovido nas 'Quintas da Fonte'. Ninguém dá valor a uma casa que lhe é oferecida por 4,26 euros mensais e que ninguém lhe tira se os não pagar - e aí já está metade da explicação para não se cuidar dela, deixando-a degradar-se de forma acelerada. Menos valor ainda se lhe dará se, além de pedir quase nada de esforço pela habitação, o Estado sustentar a família com subsídios e apoios que a dispensam de procurar trabalho. Ou que permitem a acumulação com expedientes de legalidade duvidosa, quando não criminosos.
No caso específico dos ciganos, que são um caso muito particular em matéria de integração, é público e notório, tanto nas 'Quintas da Fonte', como nas aldeias e vilas alentejanas, que se especializaram na exploração do sistema, nomeadamente no celebrado rendimento social de inserção. E que o Estado faz muito mais do que a esmagadora maioria deles faz pela sua própria integração. Na hora mais conveniente, sabem usar como ninguém a técnica da vitimização racista, seja para explorar e colher qualquer benefício, seja para justificar os seus próprios comportamentos, muitas vezes violentos e racistas. É ir às escolas, por exemplo, e perguntar quem são e como se comportam os pais mais problemáticos.
Bem podem abespinhar-se, pois, as almas pias que se tomam por mais sensíveis e anti-racistas do que todas as outras. O que as incomoda não é que o racismo exista e que ele se manifeste lá onde não dá jeito nenhum ao seu discurso politicamente correcto. O que as incomoda é que se fale disso.
O comum dos cidadãos não compreende que uma família não pague os quatro euros de renda, disse o vereador ao 'Público'. Pois não. Por motivos vários - e nem é preciso ir buscar as imagens daquele chefe de família que, vindo da 'manif' defronte da sede do município de Loures, se deslocou ao bairro para mostrar às televisões onde estavam os objectos que lhe terão roubado: o plasma, o DVD, a TV e a "playstation" do miúdo, a máquina da loiça...
O comum dos cidadãos sabe, em primeiro lugar, que, se não pagar a sua renda ou a prestação da casa, recebe ordem de despejo e põem-lhe os móveis à porta. E se lhe ocorrer ir acampar com a família em frente da Câmara Municipal, é provável que a polícia corra com ele na hora e não daí a três dias. Depois, o comum dos cidadãos pode não ter dinheiro para mais nada, mas a renda é a última dívida que deixa de pagar, como os bancos sabem melhor do que ninguém. As duas atitudes - a noção de que a falta tem castigo e de que um compromisso, mesmo o de uma renda simbólica, é para ser cumprido - revelam um certo tipo de relação do tal cidadão comum, seja um pobre de sempre, seja um 'novo pobre', com a casa que habita e com a própria sociedade.
O que mostram as contas das rendas na Quinta da Fonte é a atitude oposta: a ausência de toda a responsabilidade, a arreigada noção de que os pobres, por serem pobres - e mais ainda se forem negros ou ciganos - só têm direitos e nenhum dever, o desprezo por qualquer compromisso e a certeza absoluta da impunidade total em caso de incumprimento, mesmo reiterado.
Esta é a filosofia de vida que o Estado assistencial tem promovido nas 'Quintas da Fonte'. Ninguém dá valor a uma casa que lhe é oferecida por 4,26 euros mensais e que ninguém lhe tira se os não pagar - e aí já está metade da explicação para não se cuidar dela, deixando-a degradar-se de forma acelerada. Menos valor ainda se lhe dará se, além de pedir quase nada de esforço pela habitação, o Estado sustentar a família com subsídios e apoios que a dispensam de procurar trabalho. Ou que permitem a acumulação com expedientes de legalidade duvidosa, quando não criminosos.
No caso específico dos ciganos, que são um caso muito particular em matéria de integração, é público e notório, tanto nas 'Quintas da Fonte', como nas aldeias e vilas alentejanas, que se especializaram na exploração do sistema, nomeadamente no celebrado rendimento social de inserção. E que o Estado faz muito mais do que a esmagadora maioria deles faz pela sua própria integração. Na hora mais conveniente, sabem usar como ninguém a técnica da vitimização racista, seja para explorar e colher qualquer benefício, seja para justificar os seus próprios comportamentos, muitas vezes violentos e racistas. É ir às escolas, por exemplo, e perguntar quem são e como se comportam os pais mais problemáticos.
Bem podem abespinhar-se, pois, as almas pias que se tomam por mais sensíveis e anti-racistas do que todas as outras. O que as incomoda não é que o racismo exista e que ele se manifeste lá onde não dá jeito nenhum ao seu discurso politicamente correcto. O que as incomoda é que se fale disso.
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