A mulher de Mitt Romney viajava num avião que sofreu um pequeno incêndio e se
encheu de fumo. A peripécia foi inconsequente. Ou nem por isso: mais tarde, numa
sessão de campanha, o candidato referiu o assunto já ao lado da esposa, dizendo
não perceber porque é que as janelas dos aviões não abrem para deixar entrar o
ar. Tratou-se, conforme os correspondentes do Los Angeles Times e do New York
Times (nenhum suspeito de simpatias republicanas) asseguraram, de uma
brincadeira, aliás evidente no vídeo do episódio. É claro que a internet canhota
local tentou remover as declarações do contexto e apresentar Romney como um
tontinho, mas para efeitos internos a coisa morreu ali. Externamente, a coisa
estava apenas a começar.
Um pouco por toda a parte, incluindo em muitos países europeus e incluindo,
quase sem excepções, os media portugueses, o "jornalismo" a que temos direito
diagnosticou em uníssono a idiotia terminal de Romney, o qual, segundo a opinião
geral, gostaria de facto que as janelas de um jacto comercial descessem à
semelhança das de um Fiat Punto. A veneração cega do actual inquilino da Casa
Branca, misturada com a tendência para ver em cada membro do GOP um monumento à
ignorância, dá nisto: uma mentira transformada em "notícia" e um espectáculo em
que sujeitos com dificuldade para alinhavar uma singela peça sem erros
ortográficos discorrem sobre a boçalidade de um discípulo de Stanford e Harvard.
Boçal é o fanatismo.
Boçal e distraído, já que a reacção a gafes imaginárias impede inúmeros
"jornalistas" de reagirem a gafes reais. Que eu saiba, por cá ninguém se riu
após um político americano ter afirmado que os EUA construíram o "primeiro
comboio intercontinental". Ou após um político americano ter exaltado o bom
exemplo da FedEx por oposição ao dos correios públicos enquanto pretendia
defender um sistema de saúde financiado pelo Estado. Ou após um político
americano ter confessado que não sabia falar austríaco. Ou após um político
americano ter declarado que percorrera 57 estados da União. Ou após um político
americano ter classificado as recentes fúrias no Médio Oriente (que assassinaram
um embaixador de Washington na Líbia) de "lombas na estrada". Em qualquer dos
casos, o político americano era Barack Obama, um simpático colecionador de
cargos públicos e um presidente medíocre que, ainda assim, paira largos furos
acima do político indígena médio.
A terminar: nas circunstâncias adequadas (altitude, despressurização, etc.),
os aviões podem voar com as janelas abertas. Fechadas sem remédio só algumas
visões do mundo.
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