Artigo de Henrique Monteiro
Um dos aspetos mais interessantes de Portugal é o nível muito avançado das suas leis e das suas instituições não corresponder minimamente a qualquer eficácia na aplicação de umas e funcionamento das outras.
Veja-se o caso da ERC. Ao fim de 48 páginas de relatório chega-se rigorosamente á mesma conclusão que se tinha antes de aquele organismo ter ouvido um ror de gente - que Miguel Relvas telefonou cinco vezes numa tarde para a redação do "Público" sem que, apesar disso, haja prova de pressão ilegítima.
Em qualquer país decente, um ministro, que para mais é o coordenador político do Governo, não telefona pessoalmente cinco vezes (uma delas "em tom um bocadinho irritado", segundo um acessor) para um jornal por causa de uma notícia que não põe em causa a segurança nacional ou a imagem externa do país, mas apenas a hipótese deo próprio ser um pouco aldrabilhas...
Mas Portugal não é um país decente e a própria ERC concede que "há relações de grande proximidade" baseadas na "troca de informações" entre politicos e jornalistas. Ou seja, somos poucos, todos nos conhecemos e por isso nunca há a certeza de estarmos a falar formal ou pessoalmente. Quando Relvas (segundo a ERC) exclama, num dos seus telefonemas para a editora do jornal, "Leonete, acho isso inaceitável", é o Miguel que fala ou é o ministro?,
Mas deixemos a ERC na sua aparente inutilidade. Olhemos, por exemplo, para o preço dos combustíveis nas autoestradas. São todos iguais, independentemente das marcas. E segundo a Autoridade da Concorrência, tal não significa concertação de preços. Talvez o Zé da Galp telefone ao Manel da da BP e diga: "Estás a vender a 1,614? Eu também, tem piada". Se telefonarem 20 vezes por dia, só demonstra a amizade que têm, nada de ilícito...E o Constâncio, a consideração que tinha por Oliveira e Costa?
Pois é! Eles não regulam, eles apreciam relações humanas!