quinta-feira, 12 de outubro de 2017

PSD, Rio, Santana – estou farto de me enganar

Artigo de Henrique Monteiro no Expresso Diário

Eis uma confissão que tinha de fazer. Não consigo acertar nas intenções políticas dos nossos atores do PSD. Não pensei que Passos saísse e desistisse, por isso não pensei que Rui Rio avançasse; no meio disto achei que Santana Lopes não se meteria no ‘saco de gatos’ em que se transformou o PSD.
Quero a meu favor (e sem direito a perguntas, como agora é moda) dizer que tenho sido muito mais vezes enganado do que as vezes que me enganei. Isso significa um crédito a meu favor – e suponho que bastante largo. Feito aviso, aqui se segue o que penso acerca disto.
Passos fez bem em sair. Depois dessa decisão, o seu fácies mudou para melhor, a cara fechada deu lugar a um ataque de riso no Parlamento que parecia incontrolável, ainda por cima quando António Costa disse uma piada (com certa piada, concedo) a Hugo Soares, o líder da bancada do PSD. Passos tem a mulher com problemas de saúde, deu o que pôde e não pôde por Portugal e era insultado todos os dias, incluindo por companheiros de partido. Mesmo o maior casmurro do mundo tem um dia em que se interroga que raio está ali a fazer (sobretudo após um mau resultado eleitoral)? Nesse dia sai e sente-se aliviado. Não vai para Paris estudar Science Po e viver num andar do bairro mais exclusivo, mas mesmo ficando em Massamá pode, ainda, ser feliz.
Rio é um contabilista alemão. Dizem que é mais sério do que um rochedo inamovível. Sente o PSD com régua e esquadro. Não é de direita, não é de esquerda – é rigorosamente ao centro, como dizia Freitas do Amaral quando era desaconselhado, senão proibido ser de direita, nos idos do Verão Quente. Rio não o diz por conveniência, pensa assim mesmo. A sua formação alemã permite-lhe o humor apenas nas coisas com que se pode brincar e interdita-o naquilo com que não se brinca. É um soldado que chegou a general prussiano. Se vencer o PSD desenhará num mapa uma estratégia e disporá elementos no tabuleiro. É adepto da guerra prolongada, não da guerrilha.
São sempre os governos a perder as eleições, altura em que as ganha quem estiver à frente do principal partido da oposição
Santana é um rapazola que envelheceu e percebeu esse facto. Deixou de ser o menino guerreiro para ser uma espécie de avô cantigas. Não despreza a juventude, antes lhe dá conselhos sábios. O ex-várias coisas, incluindo primeiro-ministro e presidente do PSD, entendeu, como todos os idosos sensatos, que só há dois tipos de problemas: os que o tempo resolve e aqueles que nem o tempo resolve. Tanto sobre uns, como sobre outros, não vale a pena zangarmo-nos ou esforçar-nos demasiado. Como todos os políticos que têm os pés na terra há muito tempo, perceberá que ganha as eleições se Costa as perder. Ou seja, que são sempre os governos a perder as eleições, altura em que as ganha quem estiver à frente do principal partido da oposição. Mas Santana tem no ADN o estilo guerrilheiro e a estratégia latina atabalhoada do ‘vamos a eles’. Ao contrário de Rio, não terá mapa, nem estratégia, nem guerra prolongada. Terá improviso. Ele que confundiu os noturnos de Chopin com uma interpretação de violoncelo é, no entanto, capaz de improvisar lindamente. Impromptu assim se chama em música o que ele faz. Foi assim que viveu a vida e se fez homem (teria mais de 50 anos). Quem esteve de alma e coração com Passos estará com ele; quem acha que pode ser de direita, estará com ele; quem pensa que o anarquismo é uma teoria liberal económica estará com ele. Mas quem pensa que o futuro é totalmente controlável e previsível, preferirá Rio.
Aqueles, como eu, que se enganam – mas têm a vantagem de não ter de tomar partido – assistem deliciados. Serão tempos interessantes, até mesmo no sentido chinês da palavra (que significa tempos não muito bons para quem os vive intensamente).



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