terça-feira, 27 de outubro de 2009

O Governo É Novo? O Das Segundas-Feiras Não

Qual era o núcleo duro do Governo de José Sócrates na semana passada? Pedro Silva Pereira, Luís Amado, Teixeira dos Santos, Vieira da Silva, Augusto Santos Silva e Jorge Lacão. E qual é o núcleo duro do governo que toma posse na próxima semana? O mesmo. Esta é, para mim, a decisão mais arriscada de José Sócrates. O primeiro-ministro conseguiu renovar o Governo e recrutar um número surpreendente de independentes. Mas não arriscou um milímetro no grupo que reúne com ele todas as segundas-feiras de manhã. Esse grupo ganhou há muitos anos o nome de 'núcleo duro'. Ganhou nome, fama e proveito. O núcleo duro define as grandes linhas políticas do Governo, discute a situação política e faz o calendário das principais medidas. E é suposto que ajude o primeiro-ministro a pensar o país e a actuar politicamente. No último ano e meio, sobretudo depois da última remodelação e da decisão de abandonar a Ota (Janeiro de 2008), o Governo não foi pródigo em sensatez política. Cometeu a mais absurda e inútil guerra de que há memória com um Presidente da República por causa do Estatuto dos Açores, um documento que bateu o recorde de inconstitucionalidades. Desvalorizou o impacto da crise e do endividamento. Não deu qualquer importância política à gestão dos fundos comunitários. Geriu pessimamente o caso Freeport. Fez guerras absurdas à comunicação social. Isolou o primeiro-ministro e por pouco não o imolou. Num novo ciclo político José Sócrates precisa de coesão e de força política. Isso é decisivo. Mas precisa também de quem o contrarie de quando em vez, de quem não tenha medo de lhe dizer não, sobretudo nas fases em que a sua obstinação é um bilhete de ida para o desastre. Não quero arriscar num parágrafo de psicologia barata. Mas conheço José Sócrates suficientemente bem para poder dizer com alguma segurança que ele perde muito quando se fecha entre os seus. Todo o discurso e acção do primeiro semestre deste ano são o exemplo máximo disso. Pior era impossível. Entre o risco de abrir o seu círculo mais íntimo e a segurança de o manter inalterado, José Sócrates escolheu a segunda opção. Todas as segundas de manhã, ao chegar ao seu local de trabalho, já sabe o que vai ouvir. Vai reunir com pessoas que têm peso político e que pensam bem. Mas que pensam como ele. Vai reunir com pessoas que já sabem o que ele quer ouvir, que o conhecem como a palma da mão e que só o vão contrariar em assuntos muito graves. O Governo que reúne no Conselho de Ministros todas as quintas-feiras é novo. O das segundas não.
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Artigo de Ricardo Costa

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